Caridade e estratégia

Fonte: Jornal A Tribuna Regional, de Santo Ângelo/RS, de 25 e 26 de julho de 2009, sábado e domingo. | Atualizado em outubro de 2019.

A temática social e humanitária deste artigo do diretor-presidente da Legião da Boa Vontade, o jornalista, radialista e escritor José de Paiva Netto, abre a BOA VONTADE Mulher, revista especial que a Instituição publicou, nos idiomas português, inglês, francês e espanhol, para a 60a sessão da Comissão sobre a Situação da Mulher (CSW, na sigla em inglês) — realizada de 14 a 24 de março na sede da Organização das Nações Unidas (ONU) em Nova York, nos Estados Unidos —, em contribuição ao debate do tema do evento, “O empoderamento das mulheres e a ligação deste com o desenvolvimento sustentável”. Em razão da relevância do teor da mensagem, julgamos oportuno reproduzi-la nesta edição da BOA VONTADE.

Os editores

O destino de ser mulher e a dimensão universal do Amor Fraterno são temas que convergem e devem ser lembrados na 60a sessão da Comissão das Nações Unidas sobre a Situação da Mulher (CSW, na sigla em inglês), realizada de 14 a 24 março, em Nova York, Estados Unidos. Afinal, na maioria das vezes, está nas mãos do sexo feminino a responsabilidade de cuidar de crianças, idosos e enfermos, e do trabalho e da renda delas dependem a educação, a saúde e o bem-estar dos familiares.

Empoderar, pois, essa natural ativista dos direitos humanos é tarefa urgente para o advento de uma Sociedade Solidária Altruística Ecumênica, que exige o espírito de real Caridade, assunto sobre o qual me debruçarei neste artigo, com base na experiência de décadas de trabalho na LBV.

Vivian R. Ferreira
Rick Bajornas/UN Photo

Antonio Patriota

Antes, quero abrir parênteses para saudar o embaixador Antonio Patriota, representante permanente do Brasil junto às Nações Unidas, presidente da histórica 60a edição da CSW e antigo defensor da igualdade de gênero. Ao conceder entrevista exclusiva à revista BOA VONTADE Mulher, nos deu a honra de trazer relevantes considerações sobre o encontro, que enriqueceram aquela publicação.

Ferramenta imprescindível

Madre Teresa de Calcutá

Em 5 de setembro de 2013, a Organização das Nações Unidas lançou a comemoração anual do Dia Internacional da Caridade. A LBV foi convidada a participar e discursou sobre a força da Caridade Completa* para o cumprimento da agenda internacional de desenvolvimento sustentável, durante cerimônia, que teve lugar na sede da ONU em Nova York, EUA. Cinco de setembro faz referência à data de falecimento de uma mulher ícone no amparo aos mais pobres e vulneráveis: Madre Teresa de Calcutá (1910-1997), Prêmio Nobel da Paz em 1979.

ONU / Rick Bajornas

Ban Ki-moon

Acerca do propósito desse dia, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, declarou: “A caridade desempenha um papel importante no apoio aos valores e no trabalho das Nações Unidas. Doações de tempo ou de dinheiro; envolvimento voluntário numa das suas próprias comunidades ou no outro lado do mundo; atos de caridade e bondade sem esperar uma recompensa; estas e outras expressões de solidariedade global nos ajudam na nossa procura partilhada de viver em harmonia e de construir um futuro pacífico para todos. Saúdo esta primeira celebração do Dia Internacional da Caridade”.

Em português, Caridade rima com amizade. E não apenas pela fonética. Sua ação está intrinsecamente ligada ao gesto cordial de esclarecer e amparar os menos instruídos. Daí Zarur afirmar: “Amizade é a minha Religião”.

Na nova edição de Jesus e a Cidadania do Espírito (2019), destino um capítulo ao significado do termo Caridade, a partir de conceitos que tenho desenvolvido desde a década de 1960, convidando o(a) leitor(a) a refletir sobre essa ferramenta imprescindível, em minha opinião, para ajustar os mecanismos de uma sociedade, ainda hoje regida pelo individualismo, seja no âmbito particular ou coletivo. Aliás, esse individualismo tem contribuído para levar muita gente à indiferença, à secura de Alma, isto é, à ausência da Solidariedade, da Fraternidade, da Generosidade nos relacionamentos humanos e sociais. Aqui, alguns trechos do tema. Espero que apreciem: 

A Caridade não é um sentimento de tolos. É a misericordiosa estratégia de Deus que, aliada à Justiça Divina (que não é a violência que homens inescrupulosos têm como tal), estabelece nos corações a condição perfeita para que se governe, administre, empresarie, trabalhe, pregue, exerça a Ciência, elabore a Filosofia e se viva, com espírito de generosidade, a Religião.

Quando há Amor Fraterno, incontrastável empenho e consagrada competência, que se desenvolve com labor e zelo — desde a fixação de um simples prego na madeira (creia no seu valor próprio!) —, não existem limites para o alicerce de um mundo melhor.

Realizar o Bem voluntariamente é uma das mais belas páginas de Amor que o ser humano, ou seja, o Cidadão do Espírito, pode escrever. O Profeta Muhammad — “Que a Paz e as Bênçãos de Deus estejam sobre ele!” — ensina: “Toda boa ação é caridade. Uma boa ação é aquela que faz aparecer um sorriso no rosto do outro”.

A Caridade, aliada à Justiça e à Verdade Divinas, é o combustível das transformações profundas. Sua ação é sutil, mas eficaz. A Caridade é Deus, quando inequivocamente entendido como Amor, e não como vingança.

Reforma efetiva

Desumanidade gera desumanidade. Aí está, em resumo, a explicação do estado atual do planeta. Porém, com a riqueza de nosso Espírito, podemos edificar um amanhã mais apreciável. Entretanto, nenhuma reforma será duradoura se não houver o sentido de Caridade, o respeito ao ser humano e o bom comando atuando na Alma. (...)

A Caridade é o centro gravitacional da consciência ideológica, portanto, educacional, política, social, filosófica, científica, religiosa, artística, esportiva, doméstica e pública do Cidadão Espiritual. Desse modo, se o ser humano não tiver compreensão dela, deve esforçar-se para entendê-la, a fim de que venha a subsistir em sua própria intimidade.

Não há céu mais auspicioso do que o coração, quando iluminado pelas forças do Bem, isto é, do Amor, sinônimo de Caridade e definição de Deus, segundo João, o Evangelista-Profeta, em sua Primeira Epístola, 4:8. Ela é o divino sentimento que nos mantém vivos. Por toda a existência, mormente na hora da dor, ao invés de lamentações, não nos esqueçamos dela e a pratiquemos com devoção. Trata-se de um grande medicamento para a Alma.

A Caridade é a prova do poder do Espírito de construir promissoras épocas para os cidadãos de todo o planeta. Não há maior inspiração para a boa política do que ela. Absurdo?! O tempo mostrará que não. Aliás, já está mostrando.

Caridade: política excelente

Vivian R. Ferreira

Paulo Parisi.

Conforme afirmei, em 1981, ao saudoso jornalista italiano radicado no Brasil Paulo Rappoccio Parisi (1921-2016): Tornou-se inadiável iluminar o Capitalismo com o luzeiro do espírito moral, ético da Caridade, o qual provém de Deus — que significa Amor e Justiça, dentro da Verdade e da Misericórdia — para que a ânsia desenfreada pelo capital, ou seja, a ganância e a corrupção, não fragilize, de tempos em tempos, a Democracia, com os resultados que conhecemos muito bem. Do contrário, continuaremos a assistir, horrorizados, à negação do direito à liberdade, à vida, à saúde, ao estudo, ao emprego e à felicidade de multidões que cometeram a ousadia de nascer.

Arquivo BV

Alziro Zarur

Trata-se de Política excelente, a providência de educar, reeducar, instruir, espiritualizar no caminho da Paz, resultante da confraternidade das numerosas culturas que compõem a civilização que, em si mesma, é una, planetária. (E não esqueçamos jamais que a nossa existência não é unicamente física, porquanto começa no Alto, antes de sermos carne.) Um dia, se juntarão àqueles que, com coragem, desenvolverão esse tema, pois precisamos aprender as Leis que governam, do Mundo Espiritual, a nossa trajetória terrena. Alziro Zarur falou-nos da Política de Deus sem ódios e intolerâncias. Ei-la aí. O tempo, pelo Mestre Amor ou pela Mestra Dor, comprovará isso. Muito temos de aprender uns com os outros, seres humanos e nações, em vez de nos trucidar. Uma política, portanto, de convergência para a Fraternidade nas relações internacionais, em que, por exemplo, o esporte e o cuidado com o meio ambiente tenham ainda maior participação efetiva na vida, no desenvolvimento sustentável dos povos e dos países. Somos seres complementares. Um dia, essa realidade deverá ser mais bem compreendida, assim como eficaz e solidariamente vivenciada. Senão, o que poderá vir a suceder com a humanidade será o reinado do ódio, o extermínio consciente e inconsequente praticado por todo o planeta, salvo raras exceções, que se devem dar, pois sempre existe solução quando há Boa Vontade e consequentemente o Ecumenismo da Paz nos corações.

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Nota dos editores

* Caridade Completa — Há quase 70 anos, a Legião da Boa Vontade defende sua vanguardeira tese da Caridade Completa. A prática desse conceito, criado pelo fundador da LBV, Alziro Zarur (1914-1979), e desenvolvido por Paiva Netto, significa ir além do amparo material, visto que valoriza o indivíduo como um todo, oferecendo-lhe o apoio necessário para reerguer-se e mudar sua própria realidade. Por acreditar que nenhuma nação progrida se a população estiver desamparada, a LBV fundamenta todas as suas atividades, programas e projetos sociais e educacionais no princípio da Caridade Completa. Esse trabalho, reconhecido internacionalmente, foi, aliás, lembrado por Madre Teresa de Calcutá. A saudosa missionária, à época da inauguração do Parlamento Mundial da Fraternidade Ecumênica (o ParlaMundi da LBV), na capital federal brasileira, em 1994, felicitou o dirigente da LBV pela iniciativa:

“Prezado sr. José de Paiva Netto, confio-lhe minhas preces por todos. Que as bênçãos de Deus estejam com vocês da Legião da Boa Vontade e que muitas pessoas conheçam o Amor de Jesus por intermédio do Parlamento Mundial da Fraternidade Ecumênica da LBV e mantenham viva a Boa Nova de Seu Amor no mundo, amando uns aos outros como Ele nos amou. Que Deus os abençoe!”

José de Paiva Netto, escritor, jornalista, radialista, compositor e poeta. É presidente da Legião da Boa Vontade (LBV). Membro efetivo da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e da Associação Brasileira de Imprensa Internacional (ABI-Inter), é filiado à Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), à International Federation of Journalists (IFJ), ao Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado do Rio de Janeiro, ao Sindicato dos Escritores do Rio de Janeiro, ao Sindicato dos Radialistas do Rio de Janeiro e à União Brasileira de Compositores (UBC). Integra também a Academia de Letras do Brasil Central. É autor de referência internacional na defesa dos direitos humanos e na conceituação da causa da Cidadania e da Espiritualidade Ecumênicas, que, segundo ele, constituem “o berço dos mais generosos valores que nascem da Alma, a morada das emoções e do raciocínio iluminado pela intuição, a ambiência que abrange tudo o que transcende ao campo comum da matéria e provém da sensibilidade humana sublimada, a exemplo da Verdade, da Justiça, da Misericórdia, da Ética, da Honestidade, da Generosidade, do Amor Fraterno. Em suma, a constante matemática que harmoniza a equação da existência espiritual, moral, mental e humana. Ora, sem esse saber de que existimos em dois planos, portanto não unicamente no físico, fica difícil alcançarmos a Sociedade realmente Solidária Altruística Ecumênica, porque continuaremos a ignorar que o conhecimento da Espiritualidade Superior eleva o caráter das criaturas e, por conseguinte, o direciona à construção da Cidadania Planetária”.